José Pedro Frazão escreve a crônica 'Morta de Ciúmes'
Morta de Ciúmes
Pior que o ciúme causado pela ameaça de perda é o ciúme atribuído à inveja. Aquela dorzinha idiota provocada pelo sucesso dos outros ou pelo próprio egoísmo, que torna o invejoso um ser tão pequeno, mesquinho e desprezível. Como bem conceitua o filósofo Aristóteles: “inveja é sentir-se mal com o bem alheio”.
Pois é. A protagonista desta história não é tão feia, mas já foi mais atraente. É certo que no início, quando surgiu em Anastácio, era bem pior - uma gata borralheira, de tão mal-acabada e suja. Depois, aos quinze anos, debutou na cidade com ar de rainha, limpa, alinhada e vistosa; o centro das atrações.
Ela só não esperava que seu reinado chegasse ao fim, pela supremacia inesperada de uma antiga e horrorosa vizinha. Logo aquela velha imunda que vive cruzando a cidade sempre em direção ao rio, onde despeja seus dejetos. Tinha que ser logo essa, a mais feia das passarelas, com uma enorme, purulenta e mal-fechada cicatriz exposta da cabeça aos pés.
– Como pode, essa coitada, querer desbancar-me, roubar-me o título que mantenho há tantos anos? - reclama a nossa personagem, indignada.
Mas não adianta. Agora o povo só tem olhos para a outra, a bonitona Rua Porto Geral.
Os aplausos são para a rua feia que saiu do caritó; a pobrezinha que tirou o pé da lama; a borralheira que ganhou brilho e roupa nova; a que virou atração das festas, dos carnavais e até da renomada Festa da Farinha.
Morta de ciúmes, a Avenida Manuel Murtinho cruza ligeiro a Avenida Porto Geral em linha reta. E como, apesar de tudo, ainda é a preferida dos caminhoneiros, a sua única felicidade é sair do Frigorífico e ir dar lá na BR.
José Pedro Frazão
Crônica publicada no Correio do Estado em 25/04
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